Li e adorei!!
Apenas vinte minutos
Paixão não se complica, vive-se, já o amor é calmo, aveluda o coração
Por Beth Valentim • 05/06/2009
Entrei no banho feito louca. Maquiei o rosto. Vesti a roupa básica que sempre me deixa bem para não errar. Nem jantei. Desci esbaforida pelas escadas, porque o elevador não chegava.
Todas as noites, eu tinha apenas vinte minutos para me arrumar e logo ele estava ali, em frente a minha casa, com o seu sorriso louco. O olhar de despencar qualquer coração. E eu, tragada pelos instintos femininos, cheirava à fêmea ao acordar, ao sair para trabalhar e ao dormir. Era um tal de homem a me olhar, me seguir, ficava impressionada com tanto ser masculino rondando a minha pessoa. Seriam esses vinte minutos suficientes para me deixar tão fascinante? Despertar meus hormônios de tal jeito que o meu sorriso conseguia iluminar onde estivesse? Que momentos mágicos eram estes que introduziam os contos de fada em meu coração? Por que aquilo tudo estava acontecendo comigo?
Mas era assim todos os dias. Vinte minutos de emoção, aquecimento, corpo em alerta. E depois horas de deleite. Sublimes. Irretocáveis. Quase um levitar. As nuvens nem pareciam distantes. Eu tinha era visitado o universo. Asteróides. Estrelas cadentes passando por mim e por um fio me atingindo. Que nada! Estava imune a cada dificuldade, problema ou dor. Nem precisava apostar: vinte minutos me tiravam de qualquer tipo de preguiça para mais uma viagem a esse mistério chamado paixão. Ah, que aquecer de corpos! Os dois inspiravam o fogo. Sugeriam coisas impressionantes. Despertavam fantasias. Os líquidos existentes dentro de mim escorriam. Fluidos, essências puras do ser humano.
Paixão é algo inebriante. Tem tempo de validade segundo estudiosos, mas pode-se dar uma turbinada em seu contexto. Virar a página, escrever novos parágrafos. Paixão rejuvenesce. Adolescência, então, fica plugada ao máximo. Paixão faz a pessoa explodir o senso de humor. Seu requebrado. A trajetória se expande e as tensões aliviam.
Paixão não se complica. Vive-se. Apenas vinte minutos são suficientes. É o encontrar, beijar, transar, morrer de rir até do sexo express e se despedir
Viver momentos tórridos é saber poder desfrutar da vida. Mas que seja com alguém especial. Um homem digno, que respeite você, que traga bons frutos para o futuro. Não falo em relação estável, mas em boas lembranças. Sem marcas de frustrações ou dores que deixam cicatrizes profundas. Paixão deve ser uma história feliz. Mas é necessário que suas bases estejam claras. Se for só paixão, deleite, então que as regras estejam explicitas, senão chegam as cobranças e haja problema.
Paixão não é cabide para segurar a sua onda, pode estar certa que vai despencar lá de cima. O tombo de uma montanha construída pela paixão é de dar medo. Íngreme. Machuca demais quando se cai dela. Se deseja viver a paixão para reaquecer suas entranhas, vai ver que congelada vai estar por mais tempo do que antes. Que de nada adianta pensar em uma paixão como tampão de um buraco vazio no peito.
Paixão não se complica. Vive-se. Apenas vinte minutos são suficientes. É o encontrar, beijar, transar, morrer de rir até do sexo express e se despedir. Já no amor é preciso mais tempo. Demora mais a se construir. É passinho para lá e para cá, todos bem estudados e exercitados. Paixão é explosão. Tudo pode. Pecado? Isto existe nessas horas? Mas tem lá suas confusões. Quem vive paixão e quer amor, pode aquietar o prumo porque senão vai se contorcer de dor.
Amor é calmo. Desperta a libido serena. Não aprisiona os instintos, ao contrário, amor liberta. Paixão dói. Deixa manchas roxas na pele devido aos apertões de sua força. Marcas de beijos. Unhas. Já o amor aveluda o coração. Torna-o macio. Seu ritmo se esforça para abrandar. É compreensivo. Inquieto às vezes, mas retoma logo à sua posição na vida.
Se tiver em mente a relação de estabilidade, vá ao encontro do amor. Agora, se não sabe o que fazer, viva o frisson do momento
Depende de você querer viver paixões ou buscar o amor sereno. Este também tem surtos de paixão, mas retorna à calmaria. Se adora o aquecimento de vinte minutos de tempero, beijos longos que arranhem o queixo com a barba do eleito, você tem essa queda por paixão. Mas que venham em sua época definida. Desejo de paixão é combustão. Já o de amor é prazeroso. Não falo de prazer específico, porque é difícil separar um do outro. Mas se quer uma cama aquecida todo o tempo, pegue suas asas e fique nela, na paixão. Se pretende ter estabilidade nos sentimentos, então encontre o amor para lhe dar suporte, solidez.
Escuto várias pessoas em meu consultório contando uma determinada paixão que as fez saírem do chão. É incrível. Ao falarem reviram os olhos, ruborizam e o suor brota. Por que? Na verdade, apenas vinte minutos de conversa sobre a paixão deixa o corpo repleto de endorfina. Dá vontade de viver tudo outra vez. E a autoestima emerge vaidosa.
Mas tem gente que já viveu paixão e agora tem o amor sereno e sabe separar um do outro. Depende da maturidade adquirida. De como fez sua escolha. Afinal, não se pode ter tudo. Se adrenalina faz tremer sua essência e lhe torna viva, então que seja a eterna apaixonada. Mas se tiver em mente a relação de estabilidade, vá ao encontro do amor. Agora, se não sabe o que fazer, viva o frisson do momento. Seja ele doce, esfogueado, macio ou desesperado, quem consegue viver sem algo assim?
Recadinho: Ao começar a viver a paixão tórrida, sem compromisso e quiser transformá-la em amor, tenha cuidado. Que as bases das relação sejam bem definidas, porque depois as cobranças podem machucar você. Gandhi fala uma coisa certa: "O que começa errado termina errado". Portanto não se engane, defina o que é paixão e o que é amor, senão a casa cai.
Beth Valentim é psicanalista e escritora. Possui mestrado em Psicologia Social e é autora dos livros "Essa Tal Felicidade", da editora Elevação e "Mequiel - O Caçador de Sonhos", da editora Dunya.
Retirado de Bolsa de Mulher
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