quinta-feira, 19 de março de 2009
avo

 - Vó?

- Oi?

- O que acontece depois do "Felizes para Sempre?"

A avó até se ajeitou na cadeira. Já sabia o que acontecia quando aquelas perguntas começavam.

- Como é que você falou, meu bem?

- O que acontece depois do "Felizes para Sempre" das historinhas. A princesa encontra o príncipe e vivem felizes para sempre; termina sempre

assim... Por que eu não vejo ninguém ser feliz para sempre, então?

- Ai, ai, ai - pensou a avó. - Sabe, minha querida, tem uma tribo antiga de índios, lá no Novo México, que não acredita na passagem do tempo.

Fez menção de perguntar o que aquilo tinha a ver com a sua pergunta, mas a avó colocou a mão na sua boca, como se dissesse, espera.

- Esses índios acreditam que existem apenas dois mundos: O mundo das coisas visíveis, e o mundo das coisas invisíveis. No mundo das coisas visíveis, encontramos o que construímos: a casa, o carro, esse tricô aqui que você sempre interrompe...

- E no mundo das coisas invisíveis?

- No mundo das coisas invisíveis, encontramos tudo o que não transformamos em realidade; os sonhos, as idéias, as dificuldades, tudo o que ainda está lá, para ser realizado, e que a gente sempre deixa para depois... Depois eu vou estudar, depois eu vou tentar, depois eu vou fazer meu sonho se tornar realidade... as pessoas sempre esperam pelo futuro, a época em que serão "felizes para sempre"...

- E os índios?

- Bem, eles são mais espertos e mais avançados do que nós... , como eles não acreditam no tempo, então não acreditam também no futuro, e se não acreditam no futuro, não passam a vida inteira esperando por ele.

A menina acendeu aquele vasto sorriso, que usava sempre que as historinhas da vovó clareavam as suas dúvidas.

- O que eles fazem então?

- Acho que eles tratam de ser felizes todo dia.

- Mas eles não têm coisas chatas para fazer?

- Que coisas chatas?

- Essas que a gente faz todo dia: arrumar a cama, fazer lição de casa, arrumar a casa, comer verduras...

- Lógico que fazem.

- Como é que podem ir para escola se não acreditam no futuro? Meu pai sempre fala que trabalha e fica mal humorado para que a família tenha "um futuro melhor"... que temos que estudar para termos "um futuro melhor"...

- E o futuro fica mesmo melhor?

- Não sei, ele não chegou ainda...

Riram gostosamente.

- Sabe, querida, o que esses índios acham, é que a felicidade, o "felizes para sempre" só existe nessa passagem, das coisas irrealizadas para as

coisas realizadas. Esse é um modelo mais bacana de felicidade: é como se a felicidade fosse um quebra-cabeças que a gente monta todo dia... só que é um quebra cabeças diferente.

- Como ele é?

- Ele é feito todo dia, com coisas que a gente consegue realizar... as peças são invisíveis, e gente deve procurar por cada uma delas até encontrar. Aí a gente traz as coisas do mundo invisível para o mundo realizado. É como uma oficina. Uma Oficina de Felicidade.

Finalmente, a pergunta mais difícil:

- Você é feliz, vovó? - sorriu, suavemente.

- Sou, minha querida.

- Mesmo sendo sozinha?

- Mas eu não sou sozinha. Eu tenho você, sua mãe, e uma porção de gente no meu coração, querida. Nunca estou sozinha.

- Quando eu ficar velhinha, eu vou ser feliz, então?

- Não, meu bem. Quando você ficar criança é que vai ser feliz.

- Mas eu já sou criança.

- Então, não se esqueça de ser criança quando você crescer, tá bom?

- Combinado.

- Então vai brincar de construir felicidade, vai...

Não precisou falar duas vezes. Saiu correndo brincar.

E a avó continuou trançando, em seu tricô, a delicada trama da vida.

 

(texto de Marco Antonio Spinelli)

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Algo entre seus vinte ou trinta. Jeito de menina e alma de mulher. Recém-Casada. Estudante de Psicologia. Geek. Míope. Viciada em café. Apaixonada por chás. Do interior, mas mora na cidade grande. Amante da gastronomia. Adora enfrentar o fogão e não tem medo de tentar!!! Fã de cinema e teatro. Sonha em ser bailarina. Não vive sem música. É louca por tudo que seja ligado à moda, maquiagem, cabelos, literatura! Compulsiva por cosméticos, bolsa, sapatos e compras em geral. Compras, compras e mais compras!!! Traça de livros e revistas. Ansiosa. Acredita que a vida é uma roda-gigante. Tem seu “q” de “Drama Queen”. Agitada. Louca, apaixonada e compulsiva por fotografia. Fala pelos cotovelos. Ama escrever e não pode ver uma caneta e um papel parado que vai lá rabiscar. Escreve para poder desabafar e desabafa para poder viver!!! Acredita no Amor. Tem seu lado Amélia aflorado. Adora cheiros doces. Fã de Elvis Presley. Tem certeza que nasceu na década errada! É comilona de nascença. Notívaga. Bebe litros e mais litros de água por dia. Não sabe lavar as mãos sem lavar os punhos. Tem medo de escuro, é curiosa e adora alface!

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